Com 'Hakuna Matata', congoleses paulistas festejam feito do Mazembe
Em bagunça para acordar vizinhos, africanos se unem para torcer pelo representante do país no Mundial de Clubes e apostam em título: 'É nosso'
Tout Puissant! Sabe o que significa? Todo Poderoso"
Jules Cesar, congolês
Em francês, em português enrolado, nos diversos dialetos locais: numa mistura caracteristicamente africana, congoleses que moram em São Paulo também fizeram a festa com a classificação histórica do TP Mazembe para a final do Mundial de Clubes da Fifa, eliminando o Internacional.
“Tout Puissant Mazembe. Tout Puissant! Sabe o que significa?”, perguntou Jules Cesar Omana. Todo Poderoso. O time da República Democrática do Congo surpreendeu os brasileiros e despachou os gaúchos para casa com o placar de 2 a 0, vitória inédita de uma equipe do continente africano no campeonato.
- Eles começaram o primeiro tempo um pouco mais cautelosos, se segurando um pouco. Mas perceberam que o Inter não estava fazendo nada e, no segundo tempo viram que podiam. E logo saiu o primeiro gol. Nós não acreditávamos tanto na vitória, mas eles, jogadores, sabiam. Não tenha dúvidas disso - disse Sylvain Mbala, professor de Francês congolês que habita o Brasil há nove anos.
Na zona oeste de São Paulo, na casa de Jules Cesar, congolês paulistano há oito, ele e seus amigos conterrâneos assistiram à partida na última terça-feira, em tamanha festa que não deixou o telefone parar de tocar, e nem os vizinhos descansarem.
- O bairro inteiro acordou ontem. Eu gritei muito, não é amor? - perguntou Jules à esposa brasileira, que confirmou com a cabeça. - Fiquei ligando para todos os amigos congoleses que moram aqui e ainda recebi uma mensagem de texto do meu irmão, direto do Congo.
Na mensagem, em swahili, um dos dialetos locais oficiais, o irmão contava: “O país está em festa! Estamos bebendo tudo, tudo parou!”. “Hakuna Matata”, disse Jules, identificando seu próprio dialeto.
- “Hakuna Matata” quer dizer “sem problemas”. É do dialeto do meu povo. Nós vamos levar esse título, fiquem tranquilos. Eu não tenho dúvidas. A Inter de Milão também espera encontrar um time fraco, assim como Internacional esperava. Vamos ganhar a taça, e ainda sem levar nenhum gol.
Apesar de morarem no Brasil há bastante tempo, os congoleses confessaram terem se sentido incomodados com a transmissão do jogo.
- No começo, antes da partida, o repórter perguntou a um jogador do Mazembe se ele conhecia os atletas do Internacional e ele disse que não. O repórter achou que era orgulho dele. Mas por que eles conheceriam? Não tem jogadores famosos. Se ainda tivesse Robinho, Júlio César, Ronaldinho... Eles não são obrigados a conhecer. Lá na África a gente vê mais as coisas da Europa. Eu mesmo só conhecia o Kléber, aquele que era do Santos - afirmou Jules Cesar que diz que, no Brasil, é santista.
Nascido em Lubumbashi, cidade do Mazembe, Sylvain, que rivaliza com o amigo e se diz corintiano, gosta de afirmar que é nascido no Zaire, antigo nome do Congo. Quando ele veio para o Brasil, o país ainda não tinha o nome atual. Para eles, os brasileiros são muito diferentes dos africanos na torcida do futebol. Enquanto todo o país abraça o time nacional que os representa no exterior, aqui nem todos pensam da mesma forma.
- Você morando fora, acaba torcendo para qualquer time do seu país. Hoje o Congo está unido, assim como até alguns torcedores da África devem estar nos apoiando. Nas ruas, se torcedores de times rivais se cruzam, é guerra, como Corinthians e Palmeiras aqui em São Paulo. Mas, nessas competições, todos ficamos juntos. Assim como foi na Copa, quando Gana foi o único país que sobrou. Ficamos muito chateados com a sua eliminação.
Kidiaba, o ‘paredão’ míope
- Ele começou com aquela dancinha, e já há muito tempo. Hoje todo mundo tenta imitar ele e dançar assim. Mas ninguém consegue... - diz Jules, que desata a rir com gosto, assim como Sylvain - Se empatar e for para os pênaltis, tá tranquilo. O Mazembe é campeão, porque o Kidiaba é uma muralha e vai parar tudo.
Quando consegue parar de rir, Jules ainda completa que o goleiro, que ficou marcado no Mundial pelas suas estranhas comemorações em campo, na verdade tem um problema de visão.
- Ele tem problema nos olhos, não enxerga perfeitamente bem. Não vê muito bem de longe. Imagine se ele enxergasse? Não teria nenhuma bola que passaria por ele - completa, fazendo Sylvain rir mais ainda.
Embora a alegria de ver o time na final do Mundial seja evidente nos olhos e sorrisos dos dois torcedores, uma tristeza quase esquecida aparece quando a conversa toma um tom de sonhos distantes e quase frustrados sobre as chances futuras do futebol no país africano.
- Temos jogadores bons, bons demais. Nossos moleques têm muito talento. Alguns melhores que o Neymar, pode ter certeza. Mas não existe empresário nem essas coisas por lá. Eles ficam jogando na rua. Não tem escolinha. Se tivesse, pode ter certeza que o Congo seria mais forte no futebol mundial. O que nos falta é investimento, não tem outra coisa. O Mazembe só está tão forte ultimamente porque, além do patrocinador que é o mesmo para todos os times do país, o governador torce para o time e também ajuda. Mas falta muito ainda - concluiu Jules Cesar.
A final do Mundial será às 15h (horário de Brasília) de sábado, entre Mazembe e Inter de Milão.
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